Seminário “Moradia popular e políticas públicas no centro: Salvador, Rio de Janeiro e São Paulo”

Em maio de 2022, cerca de 50 pessoas, entre militantes pela moradia no centro, representantes de universidades, laboratórios de pesquisas, de assessorias técnicas, movimentos sociais, legisladores municipais, promotores e defensores públicos, se reuniram de forma online no Seminário “Moradia Popular e Políticas Públicas no Centro Rio de Janeiro, Salvador e São Paulo” para contar o que tem acontecido nos centros dessas três cidades brasileiras, nos últimos 25 anos. O objetivo desse encontro foi promover uma reflexão atualizada sobre as políticas e intervenções em curso nos centros antigos, e seus efeitos sobre as condições de vida e de moradia da população, especialmente da mais vulnerável.

Dentre os resultados, foi elaborado um documento contendo a compilação de propostas resultantes dos três dias de apresentações e debates e sua redação foi produzida, em conjunto, por integrantes da comissão organizadora do evento: o Laboratório de Habitação e Assentamentos Humanos (LabHab) da Faculdade de Arquitetura e Urbanismo da Universidade de São Paulo (FAUUSP); o Programa de Pós-Graduação em Arquitetura e Urbanismo da Universidade Federal da Bahia (PPGAU/UFBA); e o Laboratório Estado, Trabalho, Território e Natureza (ETTERN) do Instituto de Pesquisa e Planejamento Urbano e Regional da Universidade Federal do Rio de Janeiro (IPPUR/UFRJ).

Os organizadores reinvidicam que os programas federais de moradia popular para as áreas centrais tradicionais de grandes cidades deverão ser especialmente formulados para esses territórios, sendo necessárias ações urgentes e sustentáveis. Nesse sentido, são listadas medidas que podem ser viabilizadas pelo governo federal, como a formulação de um Programa Federal de Moradia nas Áreas Centrais e um “serviço de moradia social” destinado especificamente para a população de extrema pobreza e vulnerabilidade.

Confira o documento na íntegra, CLIQUE AQUI.

Apresentação do seminário

Nas últimas décadas, as áreas centrais de grandes cidades brasileiras têm sido objeto de intervenções urbanas com a finalidade explícita de atrair investimentos imobiliários, assim como novos perfis de moradores e frequentadores. Entre estas, as de Salvador, Rio de Janeiro e São Paulo são casos bastante emblemáticos. Nestas três cidades, embora com variações, os diagnósticos das áreas de intervenção indicam deterioração dos espaços públicos, edificações e atividades, esvaziamento populacional, assim como baixa atividade imobiliária. A questão da proteção e recuperação do patrimônio arquitetônico teve papel central em Salvador, mas também fez parte das intervenções no Rio e em São Paulo.

Não obstante o modelo de expansão periférica das metrópoles brasileiras, nas áreas centrais dessas cidades, cuja definição é elástica, permanece uma população pobre vivendo em diferentes formas de moradia precária: favelas, cortiços, alojamento nos locais dos empregos, ocupações de imóveis esvaziados, assim como situação de rua. A proximidade das oportunidades de trabalho, bastante concentradas no centro, e a redução de tempo de locomoção e despesas de transporte são determinantes na escolha dessas localizações. Outras características das áreas centrais são a concentração de populações migrantes de origens diversas e atividades culturais importantes. Neste contexto, o centro tem sido palco de importantes lutas pela moradia e direitos sociais.

No entanto, há muitas diferenças entre as características urbanas, sociais e econômicas das áreas centrais e das intervenções nas três cidades, assim como no papel dos agentes institucionais, privados e comunitários durante os processos de intervenção recentes.

A proposta do evento foi conhecer e analisar as experiências recentes de intervenção nas cidades de Salvador, Rio de Janeiro e São Paulo, tentando tirar lições para a atuação futura dos atores públicos e sociais, inspirando novas formas de tessitura de políticas para a moradia social. Sua urgência é indiscutível.

Sessão 1 – Caracterização atual dos centros do Rio de Janeiro, Salvador e São Paulo: conflitos e potencialidades.

Desde meados do século XX, os centros tradicionais vêm passando por transformações sócio-espaciais conectadas tanto à composição das atividades de comércio e serviços quanto às características da população que os habita e frequenta. Nesta sessão foram apresentadas as suas configurações mais recentes, levando-se em conta iniciativas dos governos e setores privados; efeitos sobre as condições de vida e moradia da população mais pobre; violação de direitos da população tradicional; violências contra grupos raciais e culturais específicos, incluindo trabalhadores informais; lutas populares; características do uso do solo, das edificações e dos mecanismos de regulação, entre outros. A perspectiva foi a de problematizar possibilidades e limites das políticas de melhoria e produção de habitação popular.

Sessão 2 – Intervenções públicas, mercado imobiliário e resistências.

As políticas para requalificação e o desenvolvimento do mercado nas áreas centrais das cidades de São Paulo, Salvador e Rio de Janeiro vêm contribuindo para agravar as condições de moradia para os mais pobres: expulsões, aumento do preço dos aluguéis e precarização.

Ao mesmo tempo em que a legislação urbanística, em geral, estimula modelos que destroem (ou incapacitam) os tecidos atuais e propõem soluções habitacionais inacessíveis para a população de menor renda, existe um discurso e ações concretas de expulsão de certas parcelas da população, vítima igualmente de políticas de embranquecimento e de limpeza social. Por outro lado, fazem parte deste cenário movimentos de ocupação de edifícios, resistência popular e intervenções de defensores e promotores públicos e de entidades de defesa dos direitos humanos que vêm colocando em pauta outras formas possíveis de atuação para as políticas públicas.

Sessão 3 – Políticas de habitação públicas e iniciativas populares.

Nos últimos 20 anos foram desenvolvidos instrumentos e soluções habitacionais para produzir moradias, garantir permanência no centro, criar equipamentos culturais e de trabalho para a população de média/baixa renda.

Essas alternativas foram implementadas por órgãos públicos e movimentos de moradia com diversos tipos de recursos financeiros (federais, estaduais e municipais) e com cooperação de ONGs e universidades e assessorias técnicas. A entrada do setor privado associado ao poder público em programas de moradia popular começa a ocorrer, gerando muitas questões sobre seu custo, atendimento e efeitos perversos.

Sessão 4 – Propostas e desafios para políticas locais e nacionais.

A partir das experiências e considerações expostas nas sessões anteriores, palestrantes das três cidades apresentaram avaliações cruzadas e elementos propositivos para serem consideradas nas futuras políticas públicas. Tais como:

  • estratégias de inclusão sócio espacial da população excluída do mercado e do atendimento de políticas públicas;
  • estratégias fundiárias e aplicação de instrumentos urbanísticos para produção e reforma destinada à habitação social, assim como diretrizes de novas linhas de financiamento mais inclusivas;
  • recomendações para intervenções integradas e intersetoriais de recuperação do tecido urbano e social incluindo os espaços públicos, com mobilização dos agentes locais presentes no território;
  • estratégias de controle social ampliado sobre programas e projetos, buscando garantir qualidade e continuidade.

Todos os registros do evento estão disponíveis no canal da FAUUSP no Youtube, confira:

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